quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Palavras Contidas

          Certa vez, um ser de grandes poderes, estudioso da mente e das emoções humanas, encantado com a capacidade de amar do ser humano, encontra um ser vil, cruel, feito apenas de ganância. Os olhos da criatura eram profundos, como um poço onde objetos de desejo caem e se perdem para sempre na sua insana obsessão, até que ele possa tê-los e amá-los, e cuidar deles, para que ninguém mais possa tê-los, ninguém mais, seus objetos.
           O ser sábio então decide realizar um experimento. Conhecendo o desejo da criatura por ouro, forja uma estatueta dourada, feita à imagem e semelhança do ser ganancioso. É feita bela, mesmo que a criatura em si seja horrenda, e encanta seu destinatário, pois além de ganancioso, este é vaidoso, e o desejo de  possuir sua própria imagem em ouro faz com que ele se dobre à qualquer um. Quando a brilhante estatueta cai na escuridão sem funda dos seus olhos pingando de desejo, ela está perdida para sempre.
            O sábio a oferece a criatura, dizendo porém que ela tinha certas condições especiais. Disse que ela iria se esvair com o tempo, e que o único modo dele mantê-la em suas mãos seria pedindo a estátua que ficasse. Porém, essa tinha vontade própria, e se não desejasse ficar no momento que fosse chamada à ficar, iria esvair-se com mais velocidade a cada pedido. O ser ganancioso, sua mente entupida de desejo irracional, aceita sem pensar, e toma em suas mãos o objeto, enquanto o ser mais poderoso finge ir embora e põe-se a observar seu experimento. 
          Nos primeiros momentos, o ser sorri, e se vê realmente feliz, por ter nos braços seu objeto máximo de desejo. Porém, ela começa a se esvair, a desaparecer lentamente. Ele procura não se desesperar, e a pede, com calma, que fique. Então ela vai retornando, os pedacinhos se encaixando novamente para lhe fazer sorrir novamente. E ele passa mais alguns momentos felizes. Após alguns tempo, a estatueta novamente começa a se desfazer, a soltar seus pedaços em poeira que flutua lentamente pelo ar. O ser ganancioso, vendo seu objeto de desejo, seu objeto de paixão, desfazer-se em frente aos seus olhos, olhos que começavam a lacrimejar, pede à estatueta que fique. E um grande bocado dela se esvai no ar. 
            Desesperado, ele chora. Pensa em pedir devagar, mais uma vez, com mais calma. E outro pedaço vai embora. Então ele decide que é melhor ficar calado. É melhor calar, e observar, agonizante, aquilo que você ama ir embora, perder-se, em vez de pedir, de implorar, e ver tudo ir embora de uma vez. Enquanto a poeira dourada se acumula, subindo aos céus, ele chora, chora por ter um mar de palavras dentro de si, e pela vontade insana de pedir que volte, de pedir que fique, de pedir que nada mais mude, para que ele seja feliz novamente. E não diz uma palavra. Não diz para aproveitar os últimos segundos daquilo que ama, sabendo que ela está lá, sob seus olhos, sob seu zelo... até que o último pedaço se vai, desfazendo-se no ar, uma parte da poeira prendendo-se aos seus olhos e fazendo o chorar ainda mais. E vendo o dourado no ar, ele, já tendo perdido aquilo que ama, pode soltar para ela tudo o que tem a dizer. Mas, pelo costume, não diz uma palavra.

domingo, 5 de agosto de 2012

Algo bom

{TEXTO FICTÍCIO}
           

      Quando o amor se distancia no tempo, você começa a pensar mais com o cérebro e menos com o coração. Você se torna mais racional, e percebe seus erros, palavras as quais deveria ter dado atenção, mas não soube dar. Percebo que você foi a calma onde em mim só havia ansiedade. A verdade onde eu só queria ilusão. Você foi a sensatez que diluiu minha paixão – porque sim, paixão é loucura – soltando as amarras que me prendiam à você. Eu estava preso, a sede por liberdade invisível fronte ao fogo da paixão. Naquele dia frio, você quebrou minhas correntes e me deu algo melhor: o caminho da sua casa. Agora eu posso estar com você quando eu quiser, não mais preso indefinidamente naquela jaula de sentimento insano. Agora eu não mais penso em você a cada segundo. Agora eu sou livre, e vou vivendo a liberdade que você me ensinou a viver, e não mais idolatro seu sorriso, seus gestos, seu jeito. Não. Apenas sei o quanto eles podem me fazer sorrir, e, ocasionalmente, eles passam por minha mente. Eu já sei o que eu sinto por você. Não amor, o qual desconheço. Não paixão, a qual não desejo. É algo ainda não nomeado, algo entre o bem querer e o desejo, fruto da amizade e dos caprichos do coração. Algo que eu aprecio sentir, pois já não mais me machuca, e sabe me fazer pensar com o cérebro enquanto uso o coração para suas devidas funções. Algo bom. Algo que quero compartilhar com você. Quando você quiser.