sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Um beijo ente escarpas

          Enquanto o vento carregava a areia em uma tortuosa viagem até a varanda com vista para o mar e as escarpas, eu esperava por você. As nuvens no céu rosado não formavam mais as mesmas formas que formavam no início da tarde, quando a cor do céu ainda era azul – para combinar com o mar.
          As luzes da cidade começavam a acender quando eu ouvi as leves batidas na porta da frente. Fui atendê-la com a ansiedade alcançando o ápice e logo depois se dissolvendo em alegria quando seu rosto apareceu, e sorriu do jeito especial que só você sabe sorrir.
          A noite logo chegou, para destacar a luz tremulante que vinha das velas em candelabro prateado, que adornavam a mesa de centro e faziam bruxulear o reflexo da luz em seu cabelo; ela trouxe também a lua, que, gigantesca, pôs-se na varanda para observar nós dois. Conversa posta em tempo, a atenção foi desviada para o piano sempre presente no centro da sala. Seu gesto inconfundível com os dedos teclando perto ao rosto e um sorriso maroto nos levou a sentar em frente ao instrumento, e tocamos até os dedos doerem, rindo aqui e ali de um som disforme que se contorcia no ar, quando eu ou você acidentalmente tocávamos a nota errada.
          Saímos para a rua, e por mais que uma orla de paralelepípedos com casinhas rústicas, decorada com palmeiras e cercada por escarpas fosse naturalmente linda, tudo era ainda mais belo com você lá, e seu cheiro, que por tanto tempo havia permeado minha mente, acariciando novamente meu olfato, me fez sorrir por toda a viagem, e por ter sido de origem tão feliz, não reclamei da dor que acometeu meus músculos da face no fim do dia. Comemos num esplendido restaurante, e o delicioso sabor em meu paladar era o que faltava para completar a festa dos sentidos; sua beleza, seu cheiro e sua voz.
          Você foi tudo o que eu precisava pra ser feliz naquele dia. Quando ele terminou, finalmente com um beijo, você me perguntou:
          - Eu fiquei longe por anos, sem te dar nenhuma garantia, nada, e ainda assim você estava aqui, esperando pacientemente por mim.
          E eu então respondi,
          - Você não me deu garantia, mas eu me permiti sonhar sem ter medo de me machucar. Você, talvez indiretamente, me deu algo sem o que a vida não tem a mesma graça: esperança. Por isso e pela felicidade, ontem e hoje, eu só tenho a agradecer.
          E a lua por fim sorriu para nós, e as estrelas riram alegremente num burburinho. Teriam algo para fofocar.

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